A OBRA DE CRISTO
A obra de Jesus Cristo é usualmente caracterizada pela EXPIAÇÃO que ele obteve
pelos eleitos. A natureza da expiação é de morte penal substitutiva. Paulo escreve, “o
salário do pecado é a morte” (Romanos 6.23), mas ao invés de requerer nossa própria
morte, Deus enviou Jesus Cristo para pagar por nossos pecados, levando a nossa culpa
e morrendo na cruz em nosso lugar.
Uma questão com respeito à expiação é se a morte substitutiva de Cristo era
necessária para redimir os pecadores. Duas respostas significativas a essa pergunta
são os pontos de vista da NECESSIDADE HIPOTÉTICA e da NECESSIDADE
CONSEQÜENTE E ABSOLUTA da expiação. John Murray explica-os da seguinte
forma:
O conceito conhecido como necessidade hipotética assevera que Deus podia
perdoar o pecado e salvar os seus eleitos sem expiação ou satisfação — outros
meios estavam disponíveis a ele, a quem todas as coisas são possíveis. Porém,
a forma de sacrifício vicário do seu Filho foi simplesmente o meio que Deus,
em sua graça e sabedoria soberanas, escolheu, porque este é o meio pelo qual o
maior número de vantagens concorrem, e o meio pelo qual a graça é mais
maravilhosamente revelada...
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Chamamos o outro conceito de necessidade conseqüente e absoluta. A palavra
“conseqüente” nessa designação se refere ao fato de que a vontade ou decreto
divino para salvar alguém é de livre e soberana graça. Salvar homens perdidos
não foi uma necessidade absoluta, e sim o beneplácito de Deus. Os termos
“necessidade absoluta”, porém, indicam que Deus, havendo elegido alguns
para vida eterna, meramente por seu beneplácito, teve a necessidade de
cumprir esse propósito através do sacrifício do seu próprio Filho, uma
obrigação que emanou das perfeições de sua própria natureza. 1
Se apenas essas duas opções estivem disponíveis, a necessidade conseqüente absoluta
seria preferível. A expiação não era necessária no sentido de que Deus não tinha que
salvar ninguém em absoluto. Pedro escreve: “Pois Deus não poupou os anjos que
pecaram, mas os lançou no inferno, prendendo-os em abismos tenebrosos a fim de
serem reservados para o juízo” (2 Pedro 2.4). Assim como não foi necessário que um
Deus amoroso salvasse os anjos do pecado, ele também não estava obrigado a salvar o
homem por sua própria natureza ou algo externo a ele. Todavia, por causa do seu
amor pelos eleitos, ele enviou Jesus Cristo para salvar pecadores, embora ele não
estivesse obrigado a fazê-lo.
Embora não fosse necessário que Deus salvasse pecadores, uma vez que a decisão foi
feita, a morte de Jesus se tornou necessária para pagar o preço pelos pecados dos
homens. Com referência à sua morte, Jesus orou: “Meu Pai, se for possível, afasta de
mim este cálice; contudo, não seja como eu quero, mas sim como tu queres” (Mateus
26.39). Ele pediu que se fosse de alguma forma possível, que os efeitos pretendidos
pela expiação fossem realizados de outra forma, enquanto insistindo que, de qualquer
forma, a vontade divina fosse cumprida. Após orar dessa forma: “Apareceu-lhe então
um anjo do céu que o fortalecia” (Lucas 22.43). A vontade do Pai era que Jesus
levasse a cabo a obra da expiação, subentendendo assim que a morte de Cristo era
inevitável para alcançar os resultados pretendidos. Após sua ressurreição, Jesus disse
aos seus discípulos: “Não era necessário que o Cristo sofresse essas coisas e entrasse
na sua glória?” (Lucas 24.26, Tradução do Novo Mundo), significando que esse era
realmente o único caminho.
Podemos prosseguir adiante para inquirir o porquê que a morte de Cristo era o único
caminho. Se não houvesse nenhuma expiação, todos morreriam por seus próprios
pecados (João 8.24), e a Bíblia indica que o castigo seria torturante e sem fim. Podese
ficar livre de receber o justo castigo somente outro morrer no lugar. Mas um ser
humano pecador não pode morrer para redimir outro, visto que qualquer pecador que
sofresse a ira divina estaria fazendo-o apenas por causa dos seus próprios pecados.
Assim, a expiação exigia uma oferenda perfeita e inocente. Embora Deus tivesse
instituído a prática do sacrifício animal sob a Antiga Aliança, ela somente antecipava
a morte expiatória de Cristo, visto que “é impossível que o sangue de touros e bodes
tire pecados” (Hebreus 10.4). Portanto, Cristo era o único sacrifício aceitável e
suficiente.
A necessidade conseqüente absoluta é a “posição protestante clássica”, 2 mas há uma
resposta melhor para a questão da necessidade da expiação. A partir da perspectiva do
supralapsarianismo, 3 o decreto para redimir o eleito é logicamente anterior ao decreto
da queda do homem:
1. A eleição de alguns pecadores para a salvação em Cristo; a condenação do
resto da humanidade pecadora.
2. A aplicação da obra redentora de Cristo aos pecadores eleitos.
3. A redenção dos pecadores eleitos pela obra de Cristo.
4. A queda do homem.
5. A criação do mundo e do homem.
A obra redentora de Cristo não foi uma reação ao pecado do homem; antes, Deus
decretou a queda do homem de forma que a expiação pudesse ocorrer.
Cristo foi “escolhido antes da criação do mundo” (1 Pedro 1.20) para ser o cordeiro
de Deus. Paulo escreve que a “vida eterna” foi “prometida antes dos tempos eternos”
aos “eleitos de Deus” (Tito 1.1,2), e que Deus escolheu aqueles a quem ele redimiria
“antes da criação do mundo” (Efésios 1.4). Deus determinou a identidade dos eleitos,
preferiu redimi-los, e selecionou Cristo como o redentor antes da criação do mundo.
Visto que Deus é eterno ou atemporal, isso significa que nunca existiu a possibilidade
de que ele não redimiria os seus eleitos através da morte substitutiva de Cristo. Em
realidade, o plano de redenção era logicamente uma certeza mesmo antes de Deus
decretar a queda do homem. Portanto, dada a ordem supralapsariana dos decretos
eternos, a expiação substitutiva de Cristo era uma NECESSIDADE ABSOLUTA.
Embora muitas pessoas tendam a associar a obra redentora de Cristo somente com sua
morte e ressurreição, é impossível ignorar os outros eventos de sua vida quando
discutindo a redenção. As ações que ele realizou para salvar seus eleitos do pecado
não foram limitadas aos eventos após sua prisão, mas incluem aquelas que foram
realizadas antes dela. Devemos considerar sua vida inteira como uma vida cujo
propósito foi o de redimir aqueles a quem Deus lhe tinha dado. Por exemplo, até
mesmo seu ato de adotar os atributos humanos para se tornar como nós e se identificar
conosco é parte de sua obra redentora.
Por conseguinte, alguns teólogos distinguem entre a OBEDIÊNCIA ATIVA e a
OBEDIÊNCIA PASSIVA de Cristo em nosso favor. Ambos esses termos sugerem que ele
veio para lograr êxito no ponto onde Adão falhou, a saber, para viver em perfeita
obediência para com Deus. Paulo escreve: “E, sendo encontrado em forma humana,
humilhou-se a si mesmo e foi obediente até a morte, e morte de cruz!” (Filipenses
2.8). Esses dois termos designam os dois aspectos da obediência através da qual
Cristo pagou pelos pecados dos eleitos e alcançou para eles justiça perfeita.
A obediência ativa de Cristo refere-se à sua perfeita devoção em nosso favor às leis
divinas. Ele satisfez completamente as exigências morais de Deus, que, por sua vez,
credita tal justiça àqueles que crerem em Cristo. Romanos 5.19 diz: “Logo, assim
como por meio da desobediência de um só homem muitos foram feitos pecadores,
assim também, por meio da obediência de um único homem muitos serão feitos
justos”. Muitas pessoas tendem a negligenciar esse aspecto da obra redentora de
Cristo, mas ela é uma parte necessária do que ele fez pelos eleitos.
Sustentar que Cristo precisava apenas morrer pelos pecados dos eleitos para redimilos
não consegue explicar o porquê que ele fez tantas outras coisas, tais como
obedecer às lei de Deus, suportar tentações severas, realizar numerosas boas obras e
atos de misericórdia, e viver uma vida ímpar de justiça. A verdade é que, além de nos
salvar do pecado, Cristo também mereceu uma justiça positiva em nosso favor.
Isso ajuda a explicar porque somente um breve período de tempo na vida de Jesus
consiste de ministério público ativo, enquanto antes ele vivia em relativa obscuridade.
Antes de seu ministério público, ele não apenas estava se preparando para a sua obra
de pregação e esperando o momento certo. A redenção dos eleitos dependia não
somente dos seus anos ou dias finais, mas também da obediência e justiça que ele
demonstrou durante toda a sua vida como o cabeça federal dos eleitos. Pelo que fez
antes do seu ministério, durante o seu ministério, e em sua morte e ressurreição, ele
assegurou uma justiça perfeita para ser creditada àqueles que creriam nele.
A obediência passiva de Cristo refere-se à penalidade dos pecados dos eleitos que ele
sofreu. O pecado requer punição, e a justa penalidade da provocação contra Deus é o
tormento sem fim no inferno. Visto que o castigo é interminável, não há escape ou
restauração para aqueles que estiverem sob a ira divina. Um outro teria que morrer no
lugar do pecador para que esse ficasse livre e para que a justiça de Deus fosse
satisfeita ao mesmo tempo. Contudo, “todos pecaram e estão destituídos da glória de
Deus” (Romanos 3.23) e, assim, nenhum ser humano está qualificado para morrer
pelos pecados de outro, visto que cada um mesmo é culpado disso, e receberia o justo
castigo somente por seus próprios pecados, se tivesse de sofrer sob a ira divina.
A única solução é um ser humano inocente morrer por outro, e assim sofrer
verdadeiramente a penalidade do pecado que ele mesmo não merecia. Isso foi o que
Jesus fez pelos eleitos: “Deus tornou pecado por nós aquele que não tinha pecado,
para que nele nos tornássemos justiça de Deus” (2 Coríntios 5.21). Embora Jesus não
tivesse pecado (Hebreus 4.15), ele sofreu como um pecador, visto que Deus
soberanamente imputou a culpa dos eleitos sobre ele. Assim, aqueles por quem ele
agiu como um cabeça federal — a saber, os eleitos — receberiam sua justiça perfeita
também por imputação.
Jesus sofreu muitas coisas durante sua vida terrena. Isso inclui as tentações intensas
que experimentou de Satanás (Lucas 4.1-14), a oposição por parte dos líderes
religiosos (Hebreus 12.3), e o próprio fato de que ele tivesse de suportar diversas
limitações e problemas humanos, tais como fome e cansaço, coisas às quais ele estava
imune em sua natureza divina. Isaías 53.3 diz, “Foi desprezado e rejeitado pelos
homens, um homem de dores e experimentado no sofrimento”, e o escritos aos
Hebreus declara o seguinte:
Ao levar muitos filhos à glória, convinha que Deus, por causa de quem e por
meio de quem tudo existe, tornasse perfeito, mediante o sofrimento, o autor da
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salvação deles… Embora sendo Filho, ele aprendeu a obedecer por meio
daquilo que sofreu (Hebreus 2.10, 5.8).
Seus sofrimentos se intensificaram desde a hora de sua prisão até a morte sobre a
cruz. Essa é a porção de tempo que mais temos em mente quando nos referimos ao
sofrimento de Cristo:
Então, os soldados do governador levaram Jesus ao Pretório e reuniram toda a
tropa ao seu redor. Tiraram-lhe as vestes e puseram nele um manto vermelho;
fizeram uma coroa de espinhos e a colocaram em sua cabeça. Puseram uma
vara em sua mão direita e, ajoelhando-se diante dele, zombavam: “Salve, rei
dos judeus!” Cuspiram nele e, tirando-lhe a vara, batiam-lhe com ela na
cabeça. Depois de terem zombado dele, tiraram-lhe o manto e vestiram-lhe
suas próprias roupas. Então o levaram para crucificá-lo (Mateus 27.27-31).
Embora o que Jesus tivesse de sofrer aqui fosse doloroso e humilhante, e grandemente
diferente do tratamento apropriado a Deus Filho, ele, todavia, suportou tudo isso pelos
seus eleitos. Mas não tinha acabo, pois após tudo isso, “o levaram para crucificá-lo”
(v. 31). A crucificação era uma forma de infligir morte que produzia sofrimento
extremo para a vítima.
Ainda mais terrível do que a dor física foi o sofrimento espiritual ou psicológico de
carregar a culpa dos eleitos. Jesus era perfeitamente santo e sem pecado; ele nunca
tinha sentido os efeitos do pecado sobre a consciência. Mas naquela hora Deus
imputou sobre ele todo o peso da culpa dos eleitos:
Todos nós, tal qual ovelhas, nos desviamos, cada um de nós se voltou para o
seu próprio caminho; e o Senhor fez cair sobre ele a iniqüidade de todos nós...
Por isso eu lhe darei uma porção entre os grandes, e ele dividirá os despojos
com os fortes, porquanto ele derramou sua vida até a morte, e foi contado entre
os transgressores. Pois ele levou o pecado de muitos, e pelos transgressores
intercedeu (Isaías 53.6,12).
Ele mesmo levou em seu corpo os nossos pecados sobre o madeiro, a fim de
que morrêssemos para os pecados e vivêssemos para a justiça; por suas feridas
vocês foram curados (1 Pedro 2.24).
Algumas pessoas podem se perguntar o porquê a morte de uma pessoa é suficiente
para pagar os pecados de muitas. A resposta é encontrada em Romanos 5.15, 18-19:
Entretanto, não há comparação entre a dádiva e a transgressão. Pois se muitos
morreram por causa da transgressão de um só, muito mais a graça de Deus,
isto é, a dádiva pela graça de um só homem, Jesus Cristo, transbordou para
muitos!
Conseqüentemente, assim como uma só transgressão resultou na condenação
de todos os homens, assim também um só ato de justiça resultou na
justificação que traz vida a todos os homens. Logo, assim como por meio da
desobediência de um só homem muitos foram feitos pecadores, assim também,
por meio da obediência de um único homem muitos serão feitos justos.
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Assim como Adão representou toda a raça humana quando pecou, assim Jesus
representou os eleitos em sua perfeita justiça e obra expiatória.
Quanto ao porquê um tão breve período de castigo foi suficiente para tirar os pecados
de tantos indivíduos, e aceito como um substituto suficiente para o castigo sem fim
dos pecadores, precisamos apenas considerar o valor do sacrifício e a intensidade do
sofrimento. A perfeição de Cristo era tal que Deus aceitou seu sacrifício de uma vez
por todas e seu sofrimento em favor dos eleitos como suficiente para obter a “eterna
redenção” para eles: “Não por meio de sangue de bodes e novilhos, mas pelo seu
próprio sangue, ele entrou no Santo dos Santos, de uma vez por todas, e obteve eterna
redenção” (Hebreus 9.12); “Pois também Cristo sofreu pelos pecados uma vez por
todas, o justo pelos injustos, para conduzir-nos a Deus. Ele foi morto no corpo, mas
vivificado pelo Espírito” (1 Pedro 3.18).
Em todo caso, foi a aceitação soberana de Deus da expiação que determinou e provou
sua suficiência. Assim como Adão foi um cabeça e representante federal apropriado e
legítimo daqueles que foram identificados com ele na mente de divina (a raça
humana), assim Jesus foi um cabeça e representante federal apropriado e legítimo
daqueles que foram identificados com ele na mente de Deus (os eleitos). No final das
contas, a expiação foi suficiente e eficaz porque ela satisfez o próprio padrão de
justiça de Deus.
Quanto à extensão ou o escopo da expiação, muitas pessoas presumem que Jesus
morreu por todo ser humano; contudo, a Bíblia ensina que morreu somente por
aqueles a quem Deus tinha escolhido para salvação, isto é, os eleitos. Essa doutrina é
frequentemente chamada de EXPIAÇÃO LIMITADA, mas o termo é enganoso, visto que,
embora somente indivíduos específicos tenham sido escolhidos para salvação, Cristo
realmente os salva no mais alto grau (Hebreus 7.25). Assim, muitos partidários dessa
doutrina bíblica defendem que ela é mais apropriadamente chamada de EXPIAÇÃO
PARTICULAR ou EXPIAÇÃO DEFINIDA. Eu considero o termo EXPIAÇÃO ESPECÍFICA
EFICAZ como sendo até mais descritivo, como a seguinte exposição da doutrina há de
mostrar.
A popular contestação ao ensino bíblico da expiação definida é o ponto de vista que
diz que a obra de Cristo tornou a salvação somente possível para todos, mas efetiva
para ninguém. A salvação é aplicada a uma pessoa quando ela se apropria dos
benefícios da obra redentora de Cristo. Contudo, a Escritura ensina que ele alcançou
com sucesso salvação real do pecado para todos por quem a sua obra redentora foi
tencionada, e que apenas intentou assegurar a salvação para os eleitos.
A doutrina da expiação definida está intimamente relacionada com a eleição de
indivíduos por Deus para salvação. Embora tratarei da doutrina da eleição com
maiores detalhes no próximo capítulo, ela já foi suficientemente provada nos capítulos
anteriores deste livro, de forma que podemos prosseguir com a suposição de que ela é
realmente o que a Bíblia ensina. Isto é, ele escolheu na eternidade um número
definido de indivíduos para serem salvos, enquanto que o restante foi rejeitado. A
expiação definida ensina que Cristo veio para morrer somente pelos eleitos, isto é, por
aqueles a quem Deus escolheu para salvação.
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Se Cristo pagara o preço por todos os pecados de cada ser humano, então porque
alguém seria condenado? Realmente, há aqueles que ensinam que, em sua obra de
expiação, ele pagara completamente o preço pelos pecados de todo ser humano e,
portanto, ninguém sofrerá a condenação. Essa posição do UNIVERSALISMO é
escandalosamente falsa, visto que a Escritura ensina que muitos serão enviados para o
inferno por seus pecados no dia do julgamento. A Escritura ensina que há um inferno
eterno e que muitas pessoas serão realmente enviadas para lá. Os versículos abaixo
são apenas alguns exemplos:
Se a sua mão ou o seu pé o fizerem tropeçar, corte-os e jogue-os fora. É
melhor entrar na vida mutilado ou aleijado do que, tendo as duas mãos ou os
dois pés, ser lançado no fogo eterno. E se o seu olho o fizer tropeçar, arranqueo
e jogue-o fora. É melhor entrar na vida com um só olho do que, tendo os dois
olhos, ser lançado no fogo do inferno (Mateus 18.8-9).
Serpentes! Raça de víboras! Como vocês escaparão da condenação ao inferno?
(Mateus 23.33).
Então ele dirá aos que estiverem à sua esquerda: ‘Malditos, apartem-se de mim
para o fogo eterno, preparado para o Diabo e os seus anjos... E estes irão para
o castigo eterno, mas os justos para a vida eterna’ (Mateus 25.41,46).
No Hades, onde estava sendo atormentado, ele olhou para cima e viu Abraão
de longe, com Lázaro ao seu lado. Então, chamou-o: “Pai Abraão, tem
misericórdia de mim e manda que Lázaro molhe a ponta do dedo na água e
refresque a minha língua, porque estou sofrendo muito neste fogo…Então eu te
suplico, pai: manda Lázaro ir à casa de meu pai, pois tenho cinco irmãos.
Deixa que ele os avise, a fim de que eles não venham também para este lugar
de tormento” (Lucas 16.23-24, 27-28).
Mas os covardes, os incrédulos, os depravados, os assassinos, os que cometem
imoralidade sexual, os que praticam feitiçaria, os idólatras e todos os
mentirosos — o lugar deles será no lago de fogo que arde com enxofre. Esta é
a segunda morte (Apocalipse 21.8).
Mas a maioria das pessoas que se opõe à doutrina bíblica da expiação definida não
afirma o universalismo real; antes, defendem uma posição que pode ser chamada
UNIVERSALISMO HIPOTÉTICO. Eles sustentam que Cristo tornou a salvação possível
para todos os seres humanos, e que todos deles podem ser salvos apenas se crerem no
evangelho. Contudo, se Cristo realmente pagara o preço do pecado por todos, então
porque alguém ainda seria mandado para o inferno? A resposta usual é que uma
pessoa deve aceitar pela fé o que Cristo fez, pois embora o preço do pecado tenha sido
completamente pago, Deus ainda a condenará. Mas isso significa que ele puniria os
mesmos pecados duas vezes, uma vez na cruz sobre Cristo, e uma segunda vez sobre a
pessoa que cometera aqueles pecados.
Um pregador tentou escapar desse problema dizendo que o único pecado pelo qual
Deus enviará pessoas ao inferno é o da rejeição a Jesus Cristo. Mas essa posição
contradiz passagens bíblicas que dizem que Deus de fato levará em conta os pecados
pessoais dos réprobos:
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Portanto, a ira de Deus é revelada dos céus contra toda impiedade e injustiça
dos homens que suprimem a verdade pela injustiça, pois o que de Deus se
pode conhecer é manifesto entre eles, porque Deus lhes manifestou (Romanos
1.18-19).
Porque vocês podem estar certos disto: nenhum imoral, ou impuro, ou
ganancioso, que é idólatra, tem herança no Reino de Cristo e de Deus.
Ninguém os engane com palavras tolas, pois é por causa dessas coisas que a
ira de Deus vem sobre os que vivem na desobediência (Efésios 5.5-6).
Assim, façam morrer tudo o que pertence à natureza terrena de vocês:
imoralidade sexual, impureza, paixão, desejos maus e a ganância, que é
idolatria. É por causa dessas coisas que vem a ira de Deus sobre os que vivem
na desobediência (Colossenses 3.5,6).
Também, esse ponto de vista que diz que Deus condenará pessoas apenas por sua
rejeição a Cristo, e não por seus pecados pessoais, faz supor que o pecado mais
fundamental e mais comum de incredulidade é aquele que Cristo não conseguiu pagar,
tornando assim a sua obra expiatória desesperadamente incompleta. Um outro
problema é que, visto que a culpa imputada de Adão é por si mesma suficiente para
condenar, a posição desse pregador infere, talvez sem intenção, que ninguém mais
nasceu com a culpa imputada após a obra expiatória de Cristo ter sido completada.
Essa é uma ilação que até mesmo esse pregador não pode aceitar. Entretanto, pelo
menos ele percebe que a expiação de Cristo fez um pagamento real e completo pelos
pecados, e não um pagamento meramente potencial; contudo, uma vez que ele insistiu
em afirmar a expiação universal, sua posição se tornou inconsistente e anti-bíblica.
O universalismo real é claramente falso e herético, mas o universalismo hipotético
parece para muitas pessoas como a posição que melhor se encaixa com a justiça, visto
que todos têm uma chance de serem salvos. Mas, como confirmamos anteriormente,
ao discutirmos a depravação total do homem (Romanos 3.10-12, 23), o homem está
num estado de morte espiritual (Efésios 2.1). Se for assim, não há possibilidade
nenhuma de que alguém terá fé positiva em Cristo se deixado a si mesmo. Isso
significa que, a menos que Deus escolhesse quem receberia a salvação através da
eleição soberana, e os redimisse através da expiação definida, ninguém seria salvo,
visto que ninguém aceitaria a Cristo.
Adversários da expiação definida podem alegar que, embora todos estejam
espiritualmente mortos em pecado, alguns na verdade respondem em fé a Cristo, não
porque fossem escolhidos para salvação, mas porque eles decidiram ser salvos por
suas próprias vontades. Porém, o próprio sentido de morte espiritual faz disso algo
impossível, visto que um homem morto não pode responder a ou cooperar com
qualquer assistência, ou mesmo de solicitá-la. Consequentemente, a Bíblia diz que a
fé e o arrependimento são coisas que Deus concede como dons aos seus eleitos
(Efésios 2.8,9; 2 Timóteo 2.25-26), mas ele não concede isso a todos, e assim “a fé
não é de todos” (2 Tessalonicenses 3.2). Visto que a fé em Cristo é o único caminho
para salvação, e é Deus quem escolhe a quem concede fé e arrependimento, segue-se
que é ele quem escolhe aqueles que recebem a salvação, e não os próprios indivíduos.
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Por amor ao argumento, suponhamos por um momento que, embora todos estejam
espiritualmente mortos, alguns realmente respondam ao evangelho, em fé, por si
mesmos. Mas isso significaria que pessoas espiritualmente mortas na precisam de
nenhuma graça especial da parte de Deus para fazer a decisão espiritual mais
importante de suas vidas. Como então explicamos por que uma pessoa espiritualmente
morta aceitou a Cristo, enquanto outra da mesma forma espiritualmente morta não
conseguiu fazer o mesmo? Não se segue que aqueles que são capazes de fazer a
decisão espiritual positiva são mais justos do que aqueles incapazes? Nesse caso,
então teremos que dizer que Cristo veio salvar somente os indivíduos relativamente
justos, e não os relativamente pecadores. Mas isso contradiz a premissa de todo o
evangelho.
Dizer que Deus exerce uma certa dose de influência sobre indivíduos para fazer-lhes
crer apenas prolonga o problema. Alguns parecem dele requerer uma influência mais
forte do que outros. Mas se ele exerce uma influência mais forte sobre algumas
pessoas do que sobre outras, então ele está na verdade escolhendo quem seria salvo,
especialmente se a quantidade de influência exercida não corresponder exatamente ao
grau de impiedade nos indivíduos. Por outro lado, se Deus exerce aproximadamente a
mesma dose de influência sobre indivíduos, então uma vez mais somente as pessoas
relativamente justas responderiam, o que novamente significaria que Cristo veio para
salvar somente os relativamente justos, uma noção que contradiz o ensino
escriturístico.
A conclusão necessária é a seguinte. Dado outros aspectos do ensino da Escritura, a
EXPIAÇÃO ILIMITADA ou UNIVERSAL é impossível. Visto que a natureza da expiação
envolve pagamento real e completo pelo pecado, a expiação universal
necessariamente acarretaria à salvação universal; contudo, a Escritura ensina que nem
todos serão salvos, mas que muitas pessoas se perderão e sofrerão o tormento sem fim
no inferno. Portanto, a única possibilidade escrutirística é que na eternidade Deus
selecionou um grupo definido de indivíduos para serem salvos. Então, em sua obra de
expiação, Cristo morreu somente por esses indivíduos e, assim, assegurando a
salvação real de cada um deles, não a fazendo meramente possível. Eis o porquê de a
obra redentora de Cristo ser uma expiação eficaz e específica.
O acima exposto mostra que a expiação definida é uma dedução necessária de
doutrinas bíblicas sabidamente verdadeiras. Especificamente, a doutrina da eleição, a
expiação como um pagamento completo pelo pecado, e a negação do universalismo
real, convergem para tornar a expiação definida uma necessidade lógica. Portanto, que
a expiação é específica e eficaz parece ser verdadeiro mesmo sem a evidência
escriturística direta; todavia, há muitas passagens que afirmam ou implicam essa
doutrina, e nos voltaremos agora para algumas delas. Também discutiremos a
reivindicação de que algumas passagens bíblicas parecem ensinar a expiação
universal.
Começamos repetindo, a partir da Escritura, que a natureza da expiação é de
substituição penal, de forma que a morte de Cristo fez um pagamento real e pleno
pelos pecados daqueles a quem ele representou:
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Cuidem de vocês mesmos e de todo o rebanho sobre o qual o Espírito Santo os
colocou como bispos, para pastorearem a igreja de Deus, que ele comprou com
o seu próprio sangue (Atos 20.28).
Acaso não sabem que o corpo de vocês é santuário do Espírito Santo que
habita em vocês, que lhes foi dado por Deus, e que vocês não são de si
mesmos? Vocês foram comprados por alto preço. Portanto, glorifiquem a
Deus com o seu próprio corpo (1 Coríntios 6.19-20).
E eles cantavam um cântico novo: “Tu és digno de receber o livro e de abrir os
seus selos, pois foste morto, e com teu sangue compraste para Deus gente de
toda tribo, língua, povo e nação. Tu os constituíste reino e sacerdotes para o
nosso Deus, e eles reinarão sobre a terra” (Apocalipse 5.9,10).
Cristo fez um pagamento completo para adquirir aqueles por quem ele morreu;
portanto, a linguagem dessas e de outras passagens semelhantes (Marcos 10.45; 1
Pedro 1.18,19) exclui a conclusão de que ele tornou a salvação meramente possível
para aqueles por quem morreu, mas que fez com que a salvação fosse real para eles.
Visto que Cristo foi “morto desde a criação do mundo” (Apocalipse 13.8) na mente de
Deus, e sua morte lhe deu possessão legal real de todos aqueles por quem ele morreu,
as identidades de todos aqueles que seriam salvos tinha sido imutavelmente
determinada desde a eternidade. Cristo então veio no tempo histórico para morrer
somente por esses indivíduos.
Outra clara indicação da expiação definida vem de João 10.14-15, 25-29, onde Jesus
diz o seguinte:
Eu sou o bom pastor; conheço as minhas ovelhas, e elas me conhecem, assim
como o Pai me conhece e eu conheço o Pai; e dou a minha vida pelas
ovelhas...
Eu já lhes disse, mas vocês não crêem. As obras que eu realizo em nome de
meu Pai falam por mim, mas vocês não crêem, porque não são minhas
ovelhas. As minhas ovelhas ouvem a minha voz; eu as conheço, e elas me
seguem. Eu lhes dou a vida eterna, e elas jamais perecerão; ninguém as poderá
arrancar da minha mão. Meu Pai, que as deu para mim, é maior do que todos;
ninguém as pode arrancar da mão de meu Pai.
Jesus diz, “Eu dou a minha vida pelas ovelhas”, e diz para alguns, “Vocês não crêem,
porque não são minhas ovelhas”. Ele veio para morrer por aquelas, mas algumas
pessoas não são suas ovelhas; logo, ele não morreu por todo ser humano. Aqueles que
são ovelhas de Cristo pertencem a ele, visto que o Pai “as deu para [ele]”, e todas elas
crerão no evangelho, visto que ele diz: “As minhas ovelhas ouvem a minha voz; eu as
conheço, e elas me seguem”. Por outro lado, assim como as identidades dos eleitos já
tinham sido determinadas na eternidade, não há possibilidade alguma de que aqueles
que não são suas ovelhas creiam, e assim ele diz: “Vocês não crêem, porque não são
minhas ovelhas”. Todos aqueles a quem Deus escolheu serão salvos, e uma vez
salvos, nunca perderão sua salvação, visto que Jesus diz: “Eu lhes dou a vida eterna, e
elas jamais perecerão; ninguém as poderá arrancar da minha mão”. Assim, em
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diversos versículos, Cristo não somente ensina a doutrina da expiação definida, mas
também as doutrinas da eleição, condenação e preservação, as quais discutiremos
adiante, no próximo capítulo.
Os adversários da expiação definida afirmam que algumas passagens bíblicas parecem
ensinar que a obra redentora de Cristo foi universal, em vez de específica. Aqui
responderei a duas passagens dessas:
O Senhor não demora em cumprir a sua promessa, como julgam alguns. Ao
contrário, ele é paciente com vocês, não querendo que ninguém pereça, mas
que todos cheguem ao arrependimento (2 Pedro 3.9).
Isso é bom e agradável perante Deus, nosso Salvador, que deseja que todos os
homens sejam salvos e cheguem ao conhecimento da verdade. Pois há um só
Deus e um só mediador entre Deus e os homens: o homem Cristo Jesus, o qual
se entregou a si mesmo como resgate por todos. Esse foi o testemunho dado
em seu próprio tempo (1 Timóteo 2.3-6).
Somente o exegeta mais despreparado e ingênuo suporia sem argumento que as
palavras “todos” e “todos os homens” na Bíblia devem sempre se referir a todos os
seres humanos. Podemos encontrar inúmeros exemplos em nosso falar diário no qual
o escopo desses termos aparentemente universais é limitado pelo contexto. Contudo,
para o nosso argumento ficar completo, demonstra-lo-emos primeiro utilizando
exemplos bíblicos, antes de examinar as duas passagens acima.
Jesus diz em Mateus 10.22: “Todos os homens odiarão vocês por minha causa, mas
aquele que perseverar até o fim será salvo”. Mas a declaração não pretende dizer que
todos os seres humanos sem exceção odiariam os discípulos de Cristo, visto que pelo
menos os cristãos amariam uns aos outros. Também, podemos presumir que aqueles
que não sabem acerca dos cristãos não podem odiá-los. Pode ser verdade que as
crenças e as práticas até mesmo daqueles incrédulos que não conhecem nada sobre
cristãos equivalham a ódio contra Deus e os cristãos, mas tal não parece ser o intento
desse versículo.
O significado do versículo torna-se mais claro quando lemos os versículos que vêm
antes e após ele, para obtermos o seu contexto:
O irmão entregará à morte o seu irmão, e o pai, o seu filho; filhos se rebelarão
contra seus pais e os matarão. Todos odiarão vocês por minha causa, mas
aquele que perseverar até o fim será salvo. Quando forem perseguidos num
lugar, fujam para outro. Eu lhes garanto que vocês não terão percorrido todas
as cidades de Israel antes que venha o Filho do homem (Mateus 10.21-23).
Os versículos 21 e 23 contêm informação que restringe o escopo do versículo 22.
Parece que as palavras “todos os homens” no versículo 22 se refere primariamente
àqueles mencionados nos versículos 21 e 23. Isto é, “todos os homens” significa todos
134
os tipos de pessoas, tais como os membros incrédulos da família de alguém e aqueles
que rejeitam a mensagem do evangelho ou ouvi-la. 4
Em Atos 26.4, Paulo diz: “Todos os judeus sabem como tenho vivido desde pequeno,
tanto em minha terra natal como em Jerusalém”. Ele queria dizer que toda pessoa
judia sem exceção o conhecia? O próximo versículo diz: “Eles me conhecem há muito
tempo e podem testemunhar, se quiserem, que, como fariseu, vivi de acordo com a
seita mais severa da nossa religião” (v. 5). Parece que “todos” no versículo 4 não tem
a intenção de designar toda pessoa judia sem exceção, mas todos os judeus que eram
relevantes para a situação em questão.
Salmo 8.6 diz: “Tu o fizeste dominar sobre as obras das tuas mãos; sob os seus pés
tudo puseste”. Paulo aplica esse versículo a Cristo em 1 Coríntios 15.27, mas ele
explicitamente restringe o significado de “tudo”: “Porque ele ‘tudo sujeitou debaixo
de seus pés’. Ora, quando se diz que ‘tudo’ lhe foi sujeito, fica claro que isso não
inclui o próprio Deus, que tudo submeteu a Cristo”.
Romanos 8.32 é especialmente relevante para a expiação: “Aquele que não poupou
seu próprio Filho, mas o entregou por todos nós, como não nos dará juntamente com
ele, e de graça, todas as coisas?”. Oponentes da expiação definida podem ser tentados
a entender “todos nós” como se referindo a todos seres humanos sem exceção, mas os
exemplos acima têm mostrado que não devemos admitir isso sem razão adequada.
Devemos permitir que o contexto do versículo dite o escopo das palavras “todos nós”.
Paulo indica em Romanos 1.7 que essa carta é endereçada aos cristãos em Roma: “A
todos os que em Roma são amados de Deus e chamados para serem santos: A vocês,
graça e paz da parte de Deus nosso Pai e do Senhor Jesus Cristo”. A menos que o
contexto imediato amplie o escopo para incluir todos os seres humanos sem exceção,
o significado de “todos nós” em Romanos 8.32 deve ser restringido por Romanos 1.7.
Mas os próprios versículos em torno de Romanos 8.32 restringem o significado de
“todos nós” em termos explícitos:
Sabemos que Deus age em todas as coisas para o bem daqueles que o amam,
dos que foram chamados de acordo com o seu propósito... Aquele que não
poupou seu próprio Filho, mas o entregou por todos nós, como não nos dará
juntamente com ele, e de graça, todas as coisas? Quem fará alguma acusação
contra os escolhidos de Deus? É Deus quem os justifica (Romanos 8.28,
32,33).
É claro que as palavras “todos nós” se refere somente a “aqueles a quem Deus
escolheu”, ou “os eleitos de Deus” (ARA). Portanto, o versículo 32 não dá nenhum
apoio à expiação universal; antes, ele favorece a expiação definida.
Um outro exemplo vem de Atos 2, que começa com uma descrição do que aconteceu
no dia de Pentecoste:
Chegando o dia de Pentecoste, estavam todos reunidos num só lugar. De
repente veio do céu um som, como de um vento muito forte, e encheu toda a
casa na qual estavam assentados. E viram o que parecia línguas de fogo, que se
separaram e pousaram sobre cada um deles. Todos ficaram cheios do Espírito
Santo e começaram a falar noutras línguas, conforme o Espírito os capacitava.
(v. 1-4)
Pedro então se levantou para pregar, citando a profecia de Joel: “Nos últimos dias, diz
Deus, derramarei do meu Espírito sobre todos os povos” (v. 17). Já provamos que as
palavras “todos” e “todos os homens” nem sempre se referem a todos os seres
humanos, mas devemos permitir que o contexto dos versículos relevantes restrinja o
significado dessas palavras. Esse simples princípio vale tanto para a hermenêutica
bíblica como para as conversações ordinárias; é a maior tolice e irracionalidade
ignorá-lo.
Pedro está aqui falando dentro do contexto da manifestação poderosa do Espírito no
dia de Pentecoste, dizendo que Deus derramaria seu Espírito sobre “todos os povos”.
Contudo, o escopo do versículo é restringido pelos versículos que o rodeiam, citados
abaixo:
Havia em Jerusalém judeus, tementes a Deus, vindos de todas as nações do
mundo (v. 5).
Pedro respondeu: “Arrependam-se, e cada um de vocês seja batizado em nome
de Jesus Cristo para perdão dos seus pecados, e receberão o dom do Espírito
Santo. Pois a promessa é para vocês, para os seus filhos e para todos os que
estão longe, para todos quantos o Senhor, o nosso Deus, chamar” (v. 38, 39).
As palavras “todos os povos” * são ditas no contexto de se dirigir às pessoas de “todas
as nações do mundo” e, assim, a universalidade pretendida aqui é de étnica, não uma
universalidade absoluta. Isto é, Deus derramaria seu Espírito sobre pessoas de todas
etnias, e não apenas sobre judeus. Os versículos 38,39 dizem que a promessa do
Espírito é deveras “para todos”; entretanto, tais palavras não indicam uma
universalidade absoluta, mas elas apenas se aplicam “para todos quantos o Senhor, o
nosso Deus, chamar”, restringindo assim a promessa do evangelho a um grupo
selecionado, eleito pela vontade soberana de Deus.
Voltaremos agora para 2 Pedro 3.9 e 1 Timóteo 2.3-6, que são duas das passagens
favoritas citadas pelos oponentes da expiação definida:
O Senhor não demora em cumprir a sua promessa, como julgam alguns. Ao
contrário, ele é paciente com vocês, não querendo que ninguém pereça, mas
que todos cheguem ao arrependimento (2 Pedro 3.9).
Isso é bom e agradável perante Deus, nosso Salvador, que deseja que todos os
homens sejam salvos e cheguem ao conhecimento da verdade. Pois há um só
Deus e um só mediador entre Deus e os homens: o homem Cristo Jesus, o qual
se entregou a si mesmo como resgate por todos os homens. Esse foi o
testemunho dado em seu próprio tempo (1 Timóteo 2.3-6).
2 Pedro 1.1 indica que Pedro está se dirigindo “àqueles que, mediante a justiça de
nosso Deus e Salvador Jesus Cristo, receberam conosco uma fé igualmente valiosa”, e
2 Pedro 3.8 refere-se aos “amados”, que é um termos designando os cristãos. Então, o
versículo 9 diz: “Ele é paciente com vocês, não querendo que ninguém pereça, mas
que todos cheguem ao arrependimento”. A palavra “vocês” aqui obviamente se refere
ao grupo ao qual os crentes pertencem, e não aos incrédulos. Portanto, o versículo está
dizendo que o Senhor tarda para que os eleitos tenham tempo de se tornarem cristãos.
1 Timóteo 2.3-6 diz que Deus “deseja que todos os homens sejam salvos”, e que
Cristo “entregou a si mesmo como resgate por todos os homens”. Ora, já
demonstramos que as palavras “todos” e “todos os homens” nem sempre se referem a
todos os seres humanos, e provamos ainda a doutrina da expiação definida apelando a
outras passagens bíblicas; portanto, não devemos admitir que essa passagem ensine a
expiação universal. Na realidade, visto que outras passagens tornam a expiação
universal impossível, podemos ter por certo que essa passagem não a ensina.
Entretanto, quanto às outras passagens, há evidência direta a partir do contexto da
passagem indicando que Paulo não quer dizer todos os seres humanos quando escreve
“todos os homens”. Os versículos 1 e 2 dizem: “Antes de tudo, recomendo que se
façam súplicas, orações, intercessões e ações de graças por todos os homens; pelos
reis e por todos os que exercem autoridade, para que tenhamos uma vida tranqüila e
pacífica, com toda a piedade e dignidade”. Ele diz que os crentes deveriam orar “por
todos os homens”, e prossegue explicando que por “todos os homens” ele quer dizer
“reis e todos os que exercem autoridade”. Portanto, por “todos os homens” Paulo
pretende designar tipos ou grupos de pessoas — os cristãos devem orar por todos os
tipos de pessoas.
Apocalipse 5.9,10 foi anteriormente citado para mostrar que a natureza da expiação
envolve uma aquisição real e completa por Cristo daqueles por quem ele morreu, mas
os mesmos versículos também sugerem que a universalidade da expiação não é de
tipo absoluta, mas somente étnica:
E eles cantavam um cântico novo: “Tu és digno de receber o livro e de abrir os
seus selos, pois foste morto, e com teu sangue compraste para Deus gente de
toda tribo, língua, povo e nação. Tu os constituíste reino e sacerdotes para o
nosso Deus, e eles reinarão sobre a terra”.
A Bíblia consistentemente ensina que a expiação é universal somente no sentido de
que Cristo morreu por pessoas de todas as etnias e classes sociais; nenhuma passagem
ensina que ele morreu por todos os seres humanos. Visto que tal expiação não é um
pagamento meramente potencial de pecados, mas um real, aqueles por quem ele
morreu certamente serão salvos. Assim, as boas novas é que “a graça de Deus se
manifestou salvadora a todos os homens” (Tito 2:11), e não apenas aos judeus.
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As “boas novas” do Cristianismo nunca foram que Cristo morreu para salvar todo ser
humano, mas que ele o fez para salvar gente “de toda tribo, língua, povo e nação”. A
grandeza da expiação de Cristo é que seus efeitos não são limitados por fronteiras
étnicas e sociais: “Não há judeu nem grego, escravo nem livre, homem nem mulher;
pois todos são um em Cristo Jesus” (Gálatas 3.28). Essas são as boas novas, e é como
devemos entender as passagens bíblicas que dizem que Cristo morreu por todos.
Um anjo diz a José em Mateus 1.21: “[Maria] dará à luz um filho, e você deverá darlhe
o nome de Jesus, porque ele salvará o seu povo dos seus pecados”. A doutrina da
expiação definida encara com seriedade esse versículo e muitos outros como ele,
afirmando que Jesus veio para realmente salvar e não para tornar a salvação
meramente possível, e para salvar o seu povo e não aqueles a quem Deus não
escolheu. Assim, a obra redentora de Cristo consiste de uma expiação eficaz e
específica.
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