2. ESCRITURA
Provamos que a Escritura é a autoridade definitiva no sistema cristão, e que nosso
conhecimento de Deus depende dela. Portanto, é apropriado começar o estudo da
teologia examinando os atributos da Escritura.
A NATUREZA DA ESCRITURA
Devemos enfatizar a natureza verbal ou proposicional da revelação bíblica. Numa época
em que muitos menosprezam o valor de palavras, em prol de imagens e sentimentos,
devemos notar que Deus escolheu se revelar através das palavras da linguagem humana.
A comunicação verbal é um meio adequado de transmitir informação de e sobre Deus.
Isto não somente afirma o valor da Escritura como uma revelação divina significante,
mas também o valor da pregação e da escrita como meios para comunicar a mente
divina, como apresentada na Bíblia.
A própria natureza da Bíblia como uma revelação proposicional, testifica contra as
noções populares de que a linguagem humana é inadequada para falar sobre Deus, que
as imagens são superiores às palavras, que a música tem valor maior que o da pregação,
ou que as experiências religiosas podem ensinar mais a uma pessoa, sobre as coisas
divinas, do que os estudos doutrinais.
Alguns argumentam que a Bíblia fala numa linguagem que produz vívidas imagens na
mente do leitor. Contudo, esta é somente uma descrição da reação de alguns leitores;
outros podem não responder do mesmo modo às mesmas passagens, embora eles
possam captar a mesma informação delas. Assim, isso não conta contra o uso de
palavras como a melhor forma de comunicação teológica.
Se imagens são superiores, então, por que a Bíblia não contém nenhum desenho? Não
seria a sua inclusão a melhor maneira de se assegurar que ninguém formasse imagens
mentais errôneas, se são elas deveras um elemento essencial na comunicação teológica?
Mesmo se imagens fossem importantes na comunicação teológica, o fato de que Deus
escolheu usar palavras-imagens ao invés de desenhos reais, implica que as palavras são
suficientes, se não superiores. Mas além de palavras-imagens, a Escritura também usa
palavras para discutir as coisas de Deus em termos abstratos, não associados com
quaisquer imagens.
Uma figura não vale mais do que mil palavras. Suponha que apresentemos um desenho
da crucificação de Cristo a uma pessoa que não tenha qualquer background cristão. Sem
qualquer explicação verbal, seria impossível para ela constatar a razão para sua
crucificação e o significado dela para a humanidade. A imagem em si mesma não
mostra nenhuma relação alguma entre o evento e qualquer coisa espiritual ou divina. Ela
não mostra se o evento foi histórico ou fictício. A pessoa, ao olhar para o desenho, não
saberia se o ser executado à morte era culpado de algum crime, e não haveria como
saber as palavras que ele falou enquanto estava na cruz. A menos que haja centenas de
palavras explicando a figura, a imagem, por si só, não tem nenhum significado
teológico. Mas, uma vez que há muitas palavras para explicá-la, alguém dificilmente
necessitará de imagem.
O ponto de vista que exalta a música acima da comunicação verbal sofre a mesma
crítica. É impossível derivar qualquer significado religioso da música, se ela é executada
sem palavras. É verdade que o Livro de Salmos consiste de uma grande coleção de
cânticos, provendo-nos com uma rica herança para adoração, reflexão e doutrina.
Contudo, as melodias originais não acompanharam as palavras dos salmos; nenhuma
nota musical acompanha qualquer um dos cânticos na Bíblia. Na mente de Deus, o valor
dos salmos bíblicos está nas palavras, e não nas melodias. Embora a música
desempenhe um papel na adoração cristã, sua importância não se aproxima das palavras
da Escritura ou do ministério da pregação.
Com respeito às experiências religiosas, até mesmo uma visão de Cristo não é de mais
valia do que mil palavras da Escritura. Não se pode provar a validade de uma
experiência religiosa, seja uma cura miraculosa ou uma visitação angélica, sem o
conhecimento da Escritura. Os encontros sobrenaturais mais espetaculares são vazios de
significado sem a comunhão verbal para informar a mente.
O episódio inteiro de Êxodo não poderia ter ocorrido, se Deus houvesse permanecido
em silêncio quando apareceu a Moisés, através da sarça ardente. Quando Jesus apareceu
num resplendor de luz, na estrada de Damasco, o que teria acontecido se Ele se
recusasse a responder quando Saulo de Tarso lhe perguntou: “Quem és, Senhor?” A
única razão pela qual Saulo percebeu quem estava falando com ele, foi porque Jesus
respondeu com as palavras: “Eu sou Jesus, a quem persegues” (Atos 9:3-6). As
experiências religiosas são sem significado, a menos que acompanhadas pela
comunicação verbal, transmitindo conteúdo intelectual.
Uma outra percepção errônea com respeito à natureza da Bíblia é considerar a Escritura
como um mero registro de discursos e eventos reveladores, e não a revelação de Deus
em si mesma. A pessoa de Cristo, suas ações e seus milagres revelavam a mente de
Deus, mas é um engano pensar que a Bíblia é meramente um relato escrito deles. As
próprias palavras da Bíblia constituem a revelação de Deus para nós, e não somente os
eventos aos quais elas se referem.
Alguns temem que uma forte devoção à Escritura implica em estimar mais o registro de
um evento revelador do que o evento em si mesmo. Mas, se a Escritura possui o status
de revelação divina, então tal preocupação não tem fundamento. Paulo explica que
“Toda Escritura é soprada por Deus” (2 Timóteo 3:16). A própria Escritura foi soprada
por Deus. Embora os eventos que a Bíblia registra possam ser reveladores, a única
revelação objetiva com a qual temos contato direto é a Bíblia.
Visto que a elevada opinião da Escritura que advogamos aqui é somente a que a própria
Bíblia afirma, os cristãos devem rejeitar toda doutrina exposta como sendo da Escritura
que comprometa nosso acesso à revelação infalível de Deus. Sustentar uma opinião
inferior sobre a Escritura destrói a revelação como a autoridade última de alguém, e,
então, é impossível superar o problema de epistemologia resultante. 1
Enquanto uma pessoa negar que a Escritura seja a revelação divina em si mesma, ela
permanece sendo “apenas um livro”, e essa pessoa hesita em lhe dar reverência
completa, como se fosse possível adorá-la excessivamente. Há supostos ministros
cristãos que pressionam os crentes a olhar para “o Senhor do livro, e não para o livro do
Senhor”, ou para algo com esse objetivo. Mas, visto que as palavras da Escritura foram
sopradas por Deus, e aquelas são a única revelação objetiva e explícita de Deus, é
impossível olhar para o Senhor sem olhar para o seu livro. Visto que as palavras da
Escritura são as próprias palavras divinas, alguém está olhando para o Senhor somente
até onde estiver olhando para as palavras da Bíblia. Nosso contato com Deus é através
das palavras da Escritura. Provérbios 22:17-21 indica que confiar no Senhor é confiar
em suas palavras:
Preste atenção e ouça os ditados dos sábios, e aplique o coração ao meu ensino.
Será uma satisfação guardá-los no íntimo e tê-los todos na ponta da língua. Para
que você confie no Senhor, a você hoje ensinarei. Já não lhe escrevi conselhos e
instruções, ensinando-lhe palavras dignas de confiança, para que você responda
com a verdade a quem o enviou?
Deus governa sua igreja através da Bíblia; portanto, nossa atitude para com ela reflete
nossa atitude para com ele. Ninguém que ama a Deus não amará as suas palavras da
mesma forma. Aqueles que declaram amá-lo, devem demonstrar isso por uma obsessão
zelosa para com as suas palavras:
Como eu amo a tua lei! Medito nela o dia inteiro... Como são doces para o meu
paladar as tuas palavras! Mais que o mel para a minha boca! (Salmo 119:97,103)
O temor do Senhor é puro, e dura para sempre. As ordenanças do Senhor são
verdadeiras, são todas elas justas. São mais desejáveis do que o ouro, do que
muito ouro puro; são mais doces do que o mel, do que as gotas do favo. (Salmo
19:9-10)
Uma pessoa ama a Deus somente até onde ame a Escritura. Pode haver outras
indicações do amor de alguém para com Deus, mas o amor por sua palavra é um
elemento necessário, pelo qual todos os outros aspectos da nossa vida espiritual são
mensurados.
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